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Artigo publicado na obra Relações de trabalho no desporto: estudos em homenagem ao prof. Domingos Sávio Zainaghi – Luis Guilherme Krenek Zainaghi, Fábio Menezes de Sá Filho, coordenadores. – São Paulo: LTr, 2018

  • Breve introdução

A partir da criação da Lei nº 9.615/98 – Lei Pelé – se tornaram mais frequentes na Justiça do Trabalho litígios envolvendo ex empregados de clubes de futebol cujas ações tinham como objeto principal salários em atraso, direito de arena e demais verbas sonegadas ao longo da relação laboral, a maioria delas de caráter alimentar e, portanto, de fundamental importância para a subsistência própria de sua família.

É sabido que a situação financeira dos clubes cariocas teve acentuada decadência a partir da década de 80, muito por conta de gestões amadoras, o que acarretou frequentes constrições sobre suas receitas – rendas de partidas, cotas de televisionamento, patrocínios, direitos econômicos de atletas, o hoje revogado instituto do passe, dentre outras mais variadas – e o galopante aumento do passivo trabalhista, além das dívidas fiscais e previdenciárias.

E nesse contexto os clubes passaram a encontrar cada vez mais dificuldades de sobreviver, mantendo suas obrigações trabalhistas, principalmente, em dia, apesar de não terem envidado esforços em adotar uma gestão austera focada no equacionamento de suas dívidas.

Após fartamente noticiado na mídia esportiva, com grande carga de sensacionalismo, que poderiam “fechar suas portas”, alguns deles formularam requerimento ao Exmo. Presidente do TRT da 1ª Região sugerindo fosse adotado o modelo de execução centralizada previsto na Lei de Execuções Fiscais – Lei nº 6.830/80 – com algumas alterações, o que originou o primeiro plano especial de execução centralizada no âmbito daquele Tribunal, mais conhecido como ato trabalhista, execução unificada ou centralizada, como queiram denominar.

E, em decorrência do nosso mister profissional ao longo de mais de 20 anos atuando na área do direito trabalhista desportivo, pudemos vivenciar o desequilíbrio processual imposto na relação jurídica envolvendo atletas e clubes de futebol com a criação desse novo sistema de execução. Utilizamos o termo “criação” porque apesar de fundamentar a implantação do sistema nos moldes do art. 28 da Lei nº 6.830/08, foram criadas uma série de regras excepcionais para os clubes, algumas delas ainda vigentes.

O Plano Especial de Execução, em apartada síntese, é um modelo de execução onde as penhoras e bloqueios online contra os clubes de futebol, juntamente com o cumprimento de acordos judiciais, são suspensos, obrigando os credores a se habilitarem em extensa fila num único juízo que, por sua vez, passa a ser responsável por gerenciar as execuções contra cada um deles, tal como no sistema de precatórios, até receberem seus haveres. Em contrapartida, no formato original, os devedores ficavam obrigados a depositar mensalmente naqueles juízos o valor equivalente ao percentual de 15% sobre suas receitas que seria rateado entre os primeiros da fila.

À época da implantação, cada clube tinha suas execuções centralizadas na Vara do Trabalho onde se processava a execução mais antiga contra cada um deles.

Foram diversos os prejuízos causados aos credores, os tumultos ocorridos nas Varas responsáveis por gerenciar as execuções, o que acarretou a exclusão da maioria dos clubes do ‘ato trabalhista’ por conta de sonegação de pagamentos e outros descumprimentos.

A título ilustrativo, podemos citar como exemplos a descoberta da utilização de empresas coligadas para sonegar receitas; existência de esquema com gerente de banco para zerar contas e iludir o oficial de justiça, quando ainda não existia o sistema Bacenjud (penhora online); ausência de informação de fontes de receita ao Juiz da Vara do Trabalho responsável pela centralização; dentre outras irregularidades que somente foram descobertas após detalhadas investigações. Não foram poucos os transtornos causados aos juízos responsáveis por gerenciar as execuções. Tudo decorrente da postura pouco transparente de alguns clubes e confiança na impunidade, eis que os atos trabalhistas não previam a restituição dos valores sonegados – o que só foi corrigido em 2017 -, mas tão somente a revogação do Plano Especial de Execuções com o fracionamento das execuções em suas varas de origem.

Houve também o conhecido caso da audiência realizada na garagem do TRT da Rua do Lavradio – 1ª instância – com a presença de todos os credores e o Presidente de um determinado clube que sonegara pagamentos, e que chegou a ser ameaçado de prisão por descumprir ordens judiciais.

Em 2007 o sistema foi modificado, sendo substituído o percentual sobre a receita por valor mensal fixo através do Provimento Conjunto nº 01/2007, posteriormente alterado pelo de nº 02/2008. Nesta ocasião foi criado o Juízo Auxiliar de Execuções (CAEP) com regras específicas de execução centralizada, retirando as execuções das Varas do Trabalho à época designadas centralizadoras e as reunindo nesse novo Juízo. E, ainda assim, não solucionou o problema dos credores. Pelo contrário. As sonegações persistiram; houve a exclusão de alguns clubes do ato trabalhista; foram interpostos diversos recursos por parte de clubes e credores às instancias superiores; e deferidos novos Planos Especiais de Execuções a clubes que nunca quitaram os valores sonegados anteriormente na vigência de outros atos trabalhistas.

É relevante esclarecer tais fatos, pois nunca foram mencionados nos poucos artigos escritos sobre o tema abordando os benefícios trazidos pelo sistema de execuções em comento, dando a falsa impressão de que respeitou a efetividade processual e razoável duração do processo.

Razão pela qual, pretendemos fazer um contraponto, mostrando os impactos práticos causados nos credores trabalhistas dos clubes de futebol. O intuito não é pura e simplesmente criticar o sistema criado pelo Tribunal. Apesar de louvável, se mostrou imperfeito em diversos pontos. E que as críticas e considerações aqui citadas possam servir para auxiliar no aperfeiçoamento um mecanismo de grande valia quando colocado em funcionamento de forma equilibrada para ambos os lados – clubes e credores.

Nossas colocações foram todas baseadas em fatos e documentos existentes desde a criação do primeiro de vários planos de execução centralizada em curso no Tribunal Regional do Trabalho do Rio de Janeiro, e versam sobre questões jurídicas controvertidas, supostas imperfeições nos modelos criados, as modificações impostas na execução trabalhista e, principalmente, a posição de inferioridade processual em que foram colocados os ex empregados.

Não há dúvida que alguma medida deveria ter sido criada para manter em curso as atividades financeiras dos grandes clubes de futebol do Rio de Janeiro, sem asfixia-los e, simultaneamente, permitir que suas dívidas trabalhistas fossem quitadas em tempo razoável. É ponto pacífico.

Entretanto, o procedimento denominado Plano Especial de Execuções no âmbito do TRT da 1ª Região, com todas as modificações realizadas até então, infelizmente, não conseguiu atender satisfatoriamente uma numerosa coletividade de credores que necessitavam receber seus créditos de natureza alimentar em tempo hábil, pois deles retirou mecanismos legais de promover a execução nos termos da lei processual civil. Podemos dizer sem medo de errar que somente os credores considerados preferenciais receberam seus créditos em tempo razoável.

Além do mais, não podemos desconsiderar o mundo à parte das agremiações esportivas, repleto de particularidades e cujo modus operandi é completamente distinto de qualquer empresa limitada ou sociedade anônima. E nesses anos todos constatamos que o seu enquadramento como associações sem fins lucrativos – a nosso ver não condizente com a realidade – que praticamente inviabiliza a responsabilidade patrimonial dos gestores em casos de irregularidades, contribuiu muito para que os atos trabalhistas não fossem religiosamente obedecidos.

É com razão, portanto, que esse sistema vem sendo modificado paulatinamente através de atos da Presidência com a participação efetiva a nível nacional do CGJT, objetivando criar parâmetros de execução centralizada idênticos em todos os Regionais, não apenas abrangendo clubes de futebol. Com a criação de regras mais seguras e rígidas os credores, assim como os Regionais, terão maior controle das execuções e meios de torna-las de fato mais eficazes.

  • Histórico dos Atos e Provimentos da Presidência do E. TRT da 1ª Região – considerações pontuais

O ATO Nº 2772/2003 – Republicado no Diário Oficial do Estado do Rio de Janeiro de 09 de janeiro de 2004, Parte III, Seção II, p. 114.- atendeu o requerimento formulado por BOTAFOGO FUTEBOL E REGATAS, CLUBE DE REGATAS DO FLAMENGO e FLUMINENSE FOOTBAL CLUB de:

“a) reunião de todos os processos em fase final de execução e pagamento, inclusive aqueles encerrados por acordo, em um mesmo e único juízo, qual seja, aquele que promoveu a primeira execução em face de cada requerente;

b) que seja mantida a competência do juízo originário para julgar todos os incidentes da execução até o acertamento final da conta e, somente após, sejam os autos enviados para pagamento ao MM. Juízo que promoveu a primeira execução;

c) que seja autorizada a substituição das penhoras realizadas sobre ativos financeiros dos clubes por bens imóveis ou móveis;

d) que os atos de constrições não recaiam sobre ativos financeiros;

e) que os pagamentos sejam efetuados preferencialmente nas execuções e processos encerrados por acordo, obedecida a ordem cronológica de antigüidade das execuções;

CONSIDERANDO o número expressivo de execuções em curso nesta Justiça, com comprometimento e perda do patrimônio dos requerentes, chegando, segundo alegam, à “inviabilidade do prosseguimento das atividades, o que será motivo de comoção social, seja em razão de implicar o fechamento de centenas de postos de trabalho, aumentando o atual nível de desemprego, seja em decorrência da frustração de milhões de torcedores, que o futebol ainda é a alegria do povo”;

CONSIDERANDO que a medida que requerem já foi adotada pelos Egrégios Tribunais Regionais do Trabalho da Terceira e da Sexta Região;

CONSIDERANDO que não interessa ao Estado brasileiro o estrangulamento da atividade de qualquer empregador, de modo a inviabilizar seu normal funcionamento;

CONSIDERANDO que as dificuldades relatadas pelos Clubes tomam vulto em se tratando de inegável interesse público que reveste as atividades dos requerentes;

CONSIDERANDO que a forma como vêm se processando as execuções impede a continuação da atividade dos requerentes, com comprometimento, principalmente, de pagamento de salários, contribuições previdenciárias, impostos e tributos;

CONSIDERANDO que o cumprimento das decisões se há de fazer, como quer o Código de Processo Civil, no interesse do credor, porém do modo menos gravoso para o devedor (artigo 620);

CONSIDERANDO que cabe ao Poder Judiciário dirimir e prevenir litígios, mediante atos e decisões que obedeçam ao devido processo legal, em atendimento ao Estado Democrático de Direito; (…)”

Ato contínuo, resolveu:

“Artigo 2º Suspender o cumprimento dos mandados já expedidos nas execuções iniciadas contra os Clubes requerentes, sem que tenham sido depositados os valores integrais da dívida.

Artigo 3º Determinar a centralização da arrecadação e distribuição dos valores a serem recolhidos pelos Clubes requerentes nos respectivos juízos que hajam efetuado a primeira penhora.

(…)

Artigo 5º Fixar, para a garantia das execuções em curso perante as Varas do Trabalho da cidade do Rio de janeiro, o percentual de 15% (quinze por cento) para a constrição judicial que incidirá sobre todas as rendas auferidas pelos Clubes requerentes, em especial os recursos provenientes de contratos de publicidade, de transmissão televisiva, de vendas de espaços comerciais e de ingressos para os eventos sociais e esportivos, de cessão ou transferência de direitos federativos e de empréstimos de atleta para outras agremiações – considerados os valores pagos em moeda ou não – e de contratos com entes públicos que tenham por objeto a promoção desportiva e todos os demais negócios jurídicos.

(…)

Artigo 12. A Presidência deste Tribunal colocará à disposição de cada um dos juízos centralizadores os meios necessários à consecução das medidas aqui determinadas.”

Posteriormente, o ATO Nº 673/2004 e o ATO Nº 1063/2004, estenderam ao CLUB DE REGATAS VASCO DA GAMA e ao AMÉRICA FOOTBALL CLUB, respectivamente, os efeitos do Ato nº 2.772/2003 supra.

As regras foram alteradas através do Provimento Conjunto 01/2007 e do Provimento nº 02/2008 da Presidência do Tribunal, que atualmente regem os Planos Especiais de Execução Centralizada ainda vigentes dos clubes de futebol do Rio de Janeiro.

Nos “considerandos” do Provimento nº 02/2008 ficou registrada a tarefa hercúlea enfrentada pelas Varas onde até então eram reunidas as execuções centralizadas – 18ª, 19ª, 25ª, 49ª e 56ª Varas do Trabalho – respectivamente gerenciadoras das demandas envolvendo Botafogo, Flamengo, América, Fluminense, e Vasco da Gama, verbis:

“CONSIDERANDO o volume de trabalho enfrentado pelas Varas que cumularam suas competências naturais com as decorrentes dos Atos nºs 2.772/2003, 673/2004, 1.718/2004, 1.719/2004 e 837/2007;” (…)

Outro fator relevante foi a criação do Juízo Auxiliar de Conciliação (CAEP), que passou a ser responsável pela concentração de todas as execuções pertinentes aos clubes acima citados, juntamente com as de outras empresas:

“CONSIDERANDO a instituição, como delegatário da Presidência, do Juízo Auxiliar de Conciliação de Precatórios pela Resolução Administrativa nº 1/2006;”

Mais recentemente, as regras do sistema de execuções unificadas foram alteradas no âmbito do TRT da 1ª Região pelo Provimento nº 02/2017 e, em nível nacional, pelo Provimento da Corregedoria Geral da Justiça do Trabalho (CGJT) nº 01/2018 que regulamentou a padronização do Procedimento de Reunião de Execuções no âmbito da Justiça do Trabalho.

Nossas considerações pontuais ao longo do presente artigo são direcionadas quase que na integralidade aos atos trabalhistas que tiveram início em 2003 e são atualmente regulamentados pelos Provimentos de 2007 e 2008 – os planos em vigor foram deferidos em 2011 e 2014-, eis que os Provimentos de 2017 (TRT da 1ª Região) e de 2018 (Corregedoria Geral da Justiça do Trabalho) ainda não foram aplicados aos clubes cariocas.

Pois bem.

O primeiro ponto que salta aos olhos é que a reunião dos processos em Vara única teve como base legal o artigo 28 da Lei 6.830/80 – Lei de Execuções Fiscais.[1]

A aplicação da referida lei para justificar a implementação dos atos trabalhistas sempre foi controvertida, não obstante o C. TST tenha entendimento pacificado pela legalidade da reunião de execuções contra grandes devedores em Juízo único, ignorando em grande parte os desdobramentos ora discutidos que sempre favoreceram as agremiações esportivas.

Discordamos, com toda a vênia, do sistema implantado por entendermos que não se pode conferir ao crédito trabalhista o mesmo tratamento do crédito fiscal, inexistindo sombra de dúvidas que a aplicação da Lei nº 6.830/80 na Justiça do Trabalho deve ser mitigada.

E assim se posiciona Mauro Schiavi[2]:

“Mesmo a CLT determinando que, na omissão da Lei Processual Trabalhista, deve-se primeiramente aplicar a Lei de Execuções Fiscais, a jurisprudência trabalhista tem prestigiado a aplicação imediata do Código de Processo Civil para suprir as lacunas da CLT.

A Lei de Execução Fiscal em muitos pontos é divergente da sistemática processual trabalhista, pelos seguintes elementos: a) a Lei n. 6.830/80 disciplina execução por título executivo extrajudicial, quando, nas execuções trabalhistas, a grande maior ia de títulos executivos é judicial; b) na execução trabalhista, o credor trabalhista é hipossuficiente e postula verbas alimentares; na execução fiscal, o credor é o Estado, que não é hipossuficiente, e a verba postulada não é alimentar; c) maior efetividade e proximidade do sistema da execução civil, principalmente o cumprimento da sentença, com a execução trabalhista.

A própria CLT, no art.882[3] colocou o Código de Processo Civil em primeiro lugar quanto à ordem preferencial da penhora, mesmo a Lei de Execuções Fiscais, tendo regra específica a respeito, em seu art. 11[4]. Na execução trabalhista, a efetividade e a celeridade do procedimento se potencializam, considerando a necessidade material do credor trabalhista e o caráter alimentar da verba. Por isso, a aplicação subsidiária de Lei Processual Civil, nas lacunas normativas, ontológicas e axiológicas da Lei Processual Trabalhista, deve ser mais intensa que na fase de conhecimento.”

Alguns detalhes devem ser observados. O artigo 28 da Lei 6.830/80 apontado como base legal para a reunião de processos contra o mesmo devedor, em nossa ótica, não legitima a prática que foi instituída administrativamente. O comando do dispositivo estabelece uma faculdade, tendo como destinatário o juiz da causa. Ou seja, além de não se tratar de comando impositivo, obrigatório, reserva-se ao juiz natural o exame de eventual postulação neste sentido, e não à Presidência do Tribunal.

Ainda que superada essa questão por decisões dos Tribunais superiores, há dúvidas quanto à observância do principio do juízo natural, cuja regra própria tem previsão no artigo 877 da CLT. Nesse nos valemos da lição do mestre Valentin Carrion[5]:

“A cumulação de várias execuções judiciais apenas pode ocorrer se o juiz for competente para todas, tal com se dá no processo civil (CPC, art. 573), ou seja, dentro da mesma Vara. A unificação indiscriminada de execuções, de Varas do Trabalho diversas, pela lei de execução fiscal (L.6.830/80, art. 28, que em outros dispositivos se aplica à execução trabalhista), aqui é impossível, em face do art. 877 da CLT.”

Justiça seja feita, o Ato nº 2.772/03 seguindo à risca as regras do artigo 28 da Lei nº 6.830/80[6] foi o mais eficiente dentre todos os seus desdobramentos, sendo o único sistema que permitiu aos juízes responsáveis pelo gerenciamento das execuções movidas em face de cada clube aplicar as normas processuais da CLT e do CPC no tocante a execução de valores eventualmente devidos.

Desde a criação do primeiro Plano Especial de Execução Centralizada em 2003 até a vigência dos citados provimentos, os clubes assumiram os encargos imputados por lei aos fiéis depositários sob pena de restabelecimento das execuções fracionadas, sem prejuízo das responsabilidades penal e civil cabíveis. Na teoria parecia que não haveria qualquer margem para sonegações, mas na prática a questão foi muito conturbada nesse particular.

Não havia previsão expressa da obrigação mais importante que era a de restituir os valores eventualmente sonegados através da execução forçada, sendo este um dos pontos mais prejudiciais com o qual os credores tiveram que conviver nesse período.

E a partir do momento em que os Provimentos nº 01/2007 e 02/2008 criaram o Juízo Centralizador (CAEP) e as execuções saíram do controle das varas do trabalho, o quadro mudou de figura. Se tratando de mero juízo arrecadador – administrativo – seu poder executório era simplesmente nenhum. Ainda que constatadas sonegações na casa de milhões de reais apuradas com base em estudos da própria CAEP, não havia meios legais de promover qualquer tipo de constrição, mas tão somente contar com a boa vontade do devedor em regularizar a sua situação, o que, obviamente, não ocorreu na prática.

E a única penalidade aplicada foi a exclusão do ato trabalhista – revogação do plano especial de execução – com o fracionamento das execuções em suas varas do trabalho de origem. Consequentemente, o prejuízo imposto aos credores foi irreparável financeira e cronologicamente, pois ficaram habilitados em extensa fila de recebimento anos a fio sem qualquer efetividade.

A execução na qual o devedor se furta de arcar com o pagamento de suas dívidas, sem qualquer constrição nos bens da instituição ou mesmo incidente sobre os bens pessoais dos gestores colide com os princípios constitucionais do devido processo legal e legalidade.

Outra questão que poderia ter sido melhor pensada à época seria flexibilizar a aplicação do citado artigo 620 do CPC, atual artigo 805 do CPC/15. Não obstante o artigo 805 do CPC/15 estabelecer que a execução se processe do modo menos gravoso para o devedor, tal princípio não é absoluto, devendo ser conciliado com o princípio maior preponderante, segundo o qual a execução é realizada para a satisfação do direito do credor (art. 797 do CPC/15), mormente nesta Justiça Especial.

A execução menos gravosa deveria levar em consideração as peculiaridades de cada processo, mas nunca ser aplicada de forma indiscriminada a todos eles. Se utilizar com excessivo rigor de princípio construído para o processo civil ou fiscal nas lides trabalhistas, acaba por subverter a finalidade precípua do processo do trabalho.

Assim nos ensina Mauro Schiavi[7]:

“A teoria geral do processo e também a moderna teoria geral do processo do trabalho vêm defendendo um Processo do Trabalho mais ágil, que tenha resultados. Por isso, vive-se hoje um Processo do Trabalho de resultado que seja capaz de garantir não só o cumprimento da legislação social, mas, sobretudo, da expansão do Direito Material do Trabalho. Como bem adverte Dinamarco[8], não basta o belo enunciado de uma sentença bem estruturada e portadora de afirmações inteiramente favoráveis ao sujeito, quando o que ela dispõe não se projetar utilmente na vida deste, eliminando a insatisfação que o levou a litigar e propiciando-lhe sensações felizes pela obtenção da coisa ou da situação postulada.

Advirta-se, por outro lado, que as regras do Processo Civil é que devem ser adaptadas ao Processo trabalhista, e não este ao processo civil. Além disso, ainda que omissa a CLT, as regras processuais civis não devem ser aplicadas ao processo trabalhista se não trouxerem melhorias à jurisdição trabalhista, nos aspectos de justiça e efetividade. Desse modo, ainda que existam omissões da legislação processual trabalhista, e não exista incompatibilidade da regra processual civil com os princípios e regras do processo trabalhista, se a regra processual civil não trouxer benefícios ou não for necessária, ela não deverá ser aplicada.”

A execução deve seguir de forma mais benéfica do que no processo civil, eis que no Processo do Trabalho o hipossuficiente trava uma verdadeira luta para obter o seu crédito.

É uníssono, tanto na doutrina quanto na jurisprudência, que o crédito trabalhista tem natureza alimentar e, assim, constitui crédito superprivilegiado frente aos demais créditos reconhecidos pelo ordenamento jurídico pátrio, preferindo inclusive o crédito de natureza fiscal, sendo esta mais uma razão pela qual não se tratar a execução trabalhista da mesma forma que a execução fiscal, o que enfraquece a tese dos que defendem a centralização das execuções.

Isto porque, em termos axiológicos e tendo por referência o objetivo constitucional da “razoável duração do processo” (art. 5º, LXXVIII), não é possível conceber que a execução trabalhista, cujo objeto em geral são parcelas salariais (alimentares), tenha um tratamento processual menos benéfico do que a execução de dívidas cíveis (CPC) ou do que a cobrança de tributos e afins (LEF).

A partir do momento em que foi imposto ao credor trabalhista se habilitar em extensa fila de credores sem qualquer previsão de recebimento, a preferência do crédito trabalhista sobre os demais simplesmente desapareceu. Os credores das execuções em curso na Justiça Comum continuaram a se utilizar dos meios executórios previstos na legislação processual civil, mesmo em face de grandes devedores, sem a existência de juízo único.

De nada adiantou a Lei Maior, em seu art. 100, § 1º, estatuir a preferência do débito de natureza alimentar sobre os demais e reconhecer o caráter alimentar do salário. Ainda que haja concurso de credores em determinada situação envolvendo os devedores beneficiados com o a reunião de execuções, a perseguição e recebimento do crédito trabalhista estará comprometida por força da imperiosa habilitação na fila de credores.

Podemos dizer sem chance de equívocos que o Plano Especial de Execuções tornou a execução trabalhista – ao contrário da execução de outros créditos menos privilegiados – altamente confortável para os clubes, engessando mecanismos de constrição dos credores, e os colocando em posição processual de desvantagem. E no quesito tempo em nada se tornou célere e eficaz.

Para que a execução trabalhista seja um instrumento eficaz na efetividade dos direitos fundamentais do credor, não basta que entregue o bem da vida a contento, devendo fazê-lo, também, em tempo, nos termos do direito fundamental à duração razoável do processo criado com a EC/45 da CF/88.

É utópico, sem sombra de dúvidas, pretender que a execução se realize de maneira confortável para o devedor e atenda plenamente de forma eficaz e célere os anseios do credor, sendo este talvez o grande desafio dos Tribunais com as frequentes alterações de regras dos Planos de Execução Centralizadas.

Os planos atualmente vigentes pelas regras dos Provimentos nº 02/2007 e 02/2008 do E. TRT da 1ª Região tornaram inglório o recebimento de verbas cujos valores são substanciais, pois os credores considerados “preferenciais” têm prioridade no pagamento e, como são em grande número, culminam por absorver quase que integralmente o valor mensal disponível para quitar os primeiros da fila. Ou seja, não há saldo suficiente para pagar as execuções de maior valor. Esse sistema na prática culmina por “engessar” a extensa fila de credores, pois os preferenciais se renovam a cada mês.

De fato o artigo 7º do Provimento nº 02/2008 versa sobre os créditos preferenciais, nos seguintes termos:

“Art 7º – O pagamento dos créditos indicados nas cartas de vênia obedecerá ao critério de anterioridade da intimação da sentença de liquidação ou da assinatura do termo de conciliação, à exceção dos preferenciais, que precederão os demais.

1º São considerados preferenciais, para fins do disposto no caput deste artigo:

I – os créditos dos titulares, se acometidos eles próprios ou seus dependentes de doença grave, nos termos dos incisos XI, XII e XIV do artigo 20 da Lei nº 8.036/90;

II – os créditos cujos titulares estejam enquadrados no estatuto do idoso (Lei nº 10.741/03, artigo 71), observado o limite de 150 (cento e cinqüenta) salários mínimos (Lei nº 11.101/2005, artigo 83, inciso I);

III – os créditos cujos valores não excedam a 60 (sessenta) salários mínimos (Lei nº 9.099/95);

IV – os créditos decorrentes de rescisão de contrato de trabalho, observado o limite de 150 (cento e cinqüenta) salários mínimos (Lei nº 11.101/2005, artigo 83, inciso I).

2º Para os fins estabelecidos no § 1º deste artigo, os créditos derivados da ausência ou insuficiência de depósitos em conta vinculada ao FGTS e de salários retidos são considerados decorrentes da rescisão do contrato de trabalho.”

Quanto aos grandes credores, resta se beneficiarem com o recebimento antecipado – o que não ocorre com rapidez – no limite de 150 (cento e cinquenta) salários mínimos quando a dívida engloba créditos decorrentes de rescisão de contrato de trabalho não quitada, nos termos do inciso IV supra.

Ainda, s.m.j., o Provimento nº 02/2008 do TRT da 1ª Região incorreu em grande equivoco e injustiça ao suspender o pagamento dos acordos judiciais e inserir seu respetivo valor – das parcelas faltantes para o pagamento integral – na fila de credores. Assim determinou:

“Art. 2º O artigo 2º passa a vigorar com a seguinte redação:

Art. 2º A centralização fica limitada às execuções das sentenças ou acordos proferidos em ações distribuídas até a data do deferimento do plano especial de execução (…)”

Na época em que não haviam sido instituídos os planos de execução centralizada ou mesmo nos hiatos em que os clubes tiveram seus planos revogados, não foram poucas as execuções encerradas através de acordos judiciais, após serem realizadas penhora de suas contas bancárias, bloqueio na transferência de atletas, penhora em rendas e cotas de televisão, dentre outras. Nesses casos o interesse em celebrar acordo era muito mais dos clubes do que propriamente dos reclamantes.

E os acordos trabalhistas acabavam por se tornar a medida mais benéfica para ambas as partes, mas só eram realizados muito em parte por ainda existirem mecanismos legais de execução à disposição dos credores.

Ora, como desconsiderar os acordos judiciais celebrados em suas épocas que permitiram aos clubes o benefício do pagamento parcelado de valores – muitas vezes a menor do que era devido – cuja execução imediata poderia ter lhes causado sérios prejuízos? Que fundamento legal ampara esse tipo de procedimento?

Com toda a vênia, entendemos que não foi observado o princípio da hierarquia das normas, a partir do momento em que um provimento da Presidência – administrativo – criado após a celebração do acordo judicial permitiu a sua suspensão, o que de fato se caracteriza como descumprimento do pactuado.

Nas sábias palavras de CANOTILHO,[9] a Constituição é “o fundamento da coerência intrínseca do ordenamento jurídico, tanto pelo estabelecimento de regras de hierarquia e de ordenação entre as diversas fontes como pelo estabelecimento dos princípios jurídicos fundamentais a que hão-de obedecer todas as demais fontes”. Acrescenta o mesmo mestre que “Compete à Constituição, como norma primária sobre a produção jurídica, identificar as fontes do ordenamento jurídico, ou seja, as fontes de produção normativa, e determinar a validade e eficácia de cada uma delas em relação às demais”.

Constata-se assim, que a Constituição, como fonte primeira do ordenamento jurídico, é a vertente de todas as normas emanadas do Estado, devendo estas, necessariamente, se sujeitar a esse princípio hierárquico, inclusive as decisões judiciais, sob pena de desfigurar todo o edifício construído para emprestar “validade e eficácia” a cada uma dessas normas.

Vale salientar que a coisa julgada está calcada na segurança, estabilidade e certeza jurídicas, sendo, portanto, sagrada. É tangível somente por meio de ação rescisória em casos excepcionalíssimos.

E, tendo por premissa o fato da conciliação judicial formar coisa julgada para as partes, só poderia ser modificada mediante ação rescisória, conforme entendimento consolidado na Súmula nº 259 do Colendo TST[10], razão pela qual a disposição prevista no referido provimento colidiu com o disposto nos artigos 503 do CPC/15[11], 5º, inciso XXXVI, da CF/88[12] e artigo 831, § único, da CLT[13].

Mas não é só. Toda e qualquer decisão judicial deve se sujeitar ao princípio democrático, especialmente quando se convive dentro de um estado de direito, onde a lei e a ordem jurídica são os norteadores de todas as atividades, quer do Estado, quer dos particulares. Não há espaço para imposições ilegais promovidas por atos ou provimentos de hierarquia inferior criados para legislar sobre a matéria ora discutida.

As decisões judiciais e, consequentemente os acordos celebrados de comum acordo com a chancela do Poder Judiciário, por conseguinte, deverão se sujeitar, primeiro, aos ditames da Constituição, segundo aos ditames legais, quando estes estiverem conforme o texto Magno. Afora essas circunstâncias é querer o impossível e o imaginário, dentro de uma ordem jurídica que não autoriza outra alternativa.

A supremacia da constituição engloba um aspecto material, de forma que as leis e atos normativos não podem contrariá-la; e um aspecto formal, pois é ela que fixa a organização, a estrutura, a composição, as atribuições e o procedimento dos Poderes. Daí temos que nenhum ato estatal tem validade se não estiver, formal e materialmente, em conformidade com a Constituição. A expressão “Estado de Direito”, significa, em síntese, essa submissão obrigatória de todos aos ditames das normas jurídicas.

Ainda assim, em sentido contrário, há precedente de Turma do TRT/RJ em sede de agravo de petição sustentando que a suspensão do pagamento de acordo judicial por força da entrada em vigor do Provimento nº 02/2008 não caracteriza descumprimento, sendo, portanto, descabida a aplicação da multa acordada entre as partes, devendo o crédito ser habilitado no juízo centralizador englobando apenas as parcelas faltantes.

Alguns sustentam que a implementação desse tipo de plano se justifica diante da complicada situação financeira dos grandes clubes cariocas à época. Em parte, procede, mas com muitas ressalvas. Ao longo dos anos tivemos ciência de incontáveis contratações de atletas, principalmente, muitas delas mal planejadas, envolvendo vultosas quantias, promessas de pagamento de salários altíssimos que em muitos casos não foram quitados, dentre outras medidas que passaram longe de uma gestão de fato austera. E, nesse ponto específico, entendemos que as regras da execução concentrada deveriam prever algum tipo de limitação com gastos e contratações, por estarem tratando de clubes em supostas dificuldades financeiras e que deveriam privilegiar o equacionamento de seu passivo.

Além do que, a obrigação de arcar com pagamentos e cumprir obrigações, independe da situação econômica, pois é do gestor o risco integral do negócio, não podendo este ser, de modo algum, transferido aos empregados, nos exatos termos da regra estampada no art. 2º, caput da CLT[14].

Não obstante todos os esforços do E. TRT da 1ª região, por uma série de fundamentos – muitos deles ora discutidos – sempre defendemos que esse tipo de execução excepcional deveria ter sido realizado na Justiça Comum, utilizando os mesmos parâmetros da Lei de Recuperação Judicial – Lei nº 11.101/05 – adaptando-a aos clubes de futebol, ainda que seus estatutos os denominem “entidades sem fins lucrativos”.

Não há como desenvolver extensa tese a respeito, mas alguns pontos poderiam ter sido observados desde o início da adoção desse sistema de execução.

Uma delas é que o clube em recuperação deveria assumir o ônus que lhe compete no procedimento agindo de forma adequada, tanto do ponto de vista processual, como também no desenvolvimento de sua atividade empresarial, privilegiando gestão austera de forma controlada pelo órgão do Tribunal responsável pelo gerenciamento do plano.

Razão pela qual, poderia existir a figura do administrador judicial, adaptando suas funções na execução centralizada, com base no art. 22, da Lei de Falências e Recuperação de Empresas[15]. Na prática os credores nunca tiveram representatividade, seja para denunciar irregularidades ou mesmo pleitear direitos perante a Presidência do Tribunal ou à CAEP, o que, em nossa ótica, seria ônus dos sindicatos de classe.

Imperioso ressaltar que o primeiro inciso do referido dispositivo trata das competências comuns, tanto na falência, quanto na recuperação judicial. Já o inciso II[16] trata das peculiaridades do procedimento, considerando que não existe a previsão legal de falência para clubes de futebol em nosso ordenamento pátrio, e nem seria essa a solução para as partes envolvidas e a própria sociedade.

Ainda que descabida a decretação de falência, muitos dos dispositivos do inciso III do diploma legal que versam sobre tal hipótese poderiam ter sido adaptados ao Plano Especial de Execuções desde a sua implantação por se tratarem de meios executórios e formas de compelir o devedor a regularizar sua situação. Nesse particular, os atuais provimentos do TRT da 1ª Região e da CGJT foram cirúrgicos ao prever alternativas de controle e execução.

Quanto ao quesito duração do Plano de Recuperação Judicial da Lei nº 11.101/2005, salta aos olhos a discrepância de tempo em comparação com os planos em curso na Justiça do Trabalho.

O plano de recuperação judicial regulado pela Lei nº 11.101/2005 não poderá prever prazo superior a 01 (um) ano para pagamento dos créditos derivados da legislação do trabalho ou decorrentes de acidentes de trabalho vencidos até a data do pedido de recuperação judicial. Não poderá, ainda, prever prazo superior a 30 (trinta) dias para o pagamento, até o limite de 5 (cinco) salários-mínimos por trabalhador, dos créditos de natureza estritamente salariais vencidos nos 3 (três) meses anteriores ao pedido de recuperação judicial.

Por sua vêz, o artigo 1º, § 3º, do Provimento nº 01/2007 previa que o Plano Especial de Execução seria concedido por prazo que não superior a 10 (dez) anos, o que já é uma eternidade. Vejam, portanto, quão excessivo é o seu período de duração. Pior. Na prática esse período sempre foi estendido, a partir do momento em que todos os clubes (com exceção do Clube de Regatas do Flamengo) tiveram seus planos revogados por descumprimento e, posteriormente, incluídos em novas centralizações de suas execuções. Apesar do modelo “excepcional” de execução vigorar desde 2003, as dívidas trabalhistas não foram integralmente quitadas, ao contrário.

Ou seja, há em curso sistema excepcional de execução em vigor desde 2003 – há 15 anos! -, que até o momento não conseguiu solucionar a vida dos credores de forma plena. Certamente as novas regras diminuirão esses percalços. Enquanto isso, por parte dos clubes, não há do que reclamar.

E com a entrada em vigor do Provimento CGJT Nº 01/2018, o modelo foi aprimorado em muitos pontos, principalmente no tocante a efetividade e celeridade dos procedimentos executórios, sendo prematuro tecer qualquer comentário acerca da sua efetividade.

Certamente, uma das mais importantes alterações nas regras da execução centralizada foi a possibilidade dos Juízos responsáveis, além de fiscalizarem rigorosamente o cumprimento do plano, procederem a execução de valores porventura sonegados.

Defendemos aqui a tese da imediata aplicação das regras deste último provimento por se tratar de norma editada pela Corregedoria Geral da Justiça do Trabalho, de hierarquia superior aos Regionais, e também por ter sido editada após o Provimento de 2017, devendo prevalecer seus termos em caso de conflito – ex. O TRT da 1ª Região determina o prazo limite de 06 (seis) anos para os planos de execução centralizada, enquanto o a CGJT baliza esse período em 03 (três) anos. Assim dispõem os artigos 13 e 14 do Provimento nº 01/2018 da CGJT:

“Art.13 – Aplica-se o presente Procedimento de Reunião de Execuções, no que couber, às execuções que já se encontrarem reunidas no âmbito da Justiça do Trabalho bem como ao Regime Centralizado de Execução (Ato Trabalhista) para as entidades desportivas de que trata o § 10 do art. 27 da Lei nº 9.615, de 24 de março de 1998.

Art. 14. Este Provimento entra em vigor na data da sua publicação.”

Ainda, em apartada comparação entre ambos, nos parece que as normas do Provimento editado pela CGJT são bem mais rigorosas para os clubes requerentes e consequentemente mais benéficas aos credores, principalmente se considerarmos as normas anteriores. Seguem alguns tópicos mais relevantes:

a) Provimento Conjunto nº 2/2017, da Presidência e da Corregedoria do Tribunal Regional do Trabalho da 1ª Região – Prazo máximo de 06 anos (art. 1º, § 2º); ausência de previsão de responsabilização dos sócios e de empresas integrantes do grupo econômico; o descumprimento das obrigações estabelecidas no plano acarreta seu cancelamento imediato com o restabelecimento das execuções fracionadas, bem como execução da garantia ofertada (art. 3º, § 1º), podendo ainda ser estabelecida cláusula penal (art. 5º, § 1º, II); a garantia patrimonial consiste na indicação de bens à penhora, observada a ordem do art. 835, § 2º do CPC (art. 3º, VII, garantido um pagamento mínimo 12 (doze) meses, devendo ser renovada nos 60 dias que antecedem o final desse período; tem como requisitos para deferimento do Plano Especial de Reunião de Execuções a apresentação de certidão de distribuição de demandas e balanço patrimonial dos últimos 5 anos; os pagamentos são valores fixos mensais até o 15º dia de cada mês (art. 1o, § 3o c/c art. 3o, VI); admite a oposição de Embargos à Execução no juízo de execução (art. 7º § 2o), desde que haja garantia do juízo; e, por fim, abrange as demandas distribuídas até a data de seu deferimento, excluídas as demandas cujo valor seja inferior ou igual ao depósito para interposição de RR (art. 4º, caput e § 1º).

b) Provimento nº 01/2018 da CGJT – prazo de duração de até 03 anos (art. 4º, II); responsabilidade solidária dos sócios e de empresas integrantes do grupo econômico em caso de descumprimento (art. 4º, IV), com a revogação do plano deferido, proibição de obtenção de novo Plano pelo prazo de 02 anos, e instauração do Regime Especial de Execução Forçada – REEF (art. 4º, § 2º); Admite-se como garantia patrimonial carta de fiança bancária ou seguro garantia (art. 4º, V); é requisito do deferimento do plano especificar o valor total da dívida (com estimativa juros e correção até o cumprimento integral) e relação de processos em fase de execução definitiva, enviar mensalmente cópia do CAGED ao sindicato laboral, e relacionar documentalmente empresas do grupo, sócios, que estarão cientes de sua responsabilidade solidária pelo adimplemento das obrigações; os pagamentos poderão ser fixados em período e montantes variáveis (art. 4º, II); o deferimento do plano depende da apresentação de renúncia a toda e qualquer impugnação, recurso ou incidente quanto aos processos envolvidos no ato trabalhista (art. 4º, VII);e tem como abrangência os processos relacionados no ato da apresentação do requerimento, sendo vedada a inclusão de novos processos (art. 4º, § 1º).

Em comum, ambos os provimentos obrigam os clubes devedores a apresentar balanço patrimonial e demonstrativos contábeis que comprovem sua incapacidade de pagamento e graves prejuízos potenciais, sendo obrigados ainda a manter rigorosamente em dia os pagamentos de verbas contratuais e rescisórias.

Louvável o novo limite de 03 (três) anos aplicado pelas novas regras das execuções centralizadas, restando aguardar seja aplicado rigorosamente, sem a necessidade de futuros aditivos que eternizem um procedimento que, por sua natureza, é excepcional.

Sem exceção, todos os clubes descumpriram seus respectivos atos trabalhistas, seja por sonegações ou utilização de artifícios pouco ortodoxos para ludibriar os credores e o Tribunal que tanto se emprenhou em auxiliar na equalização do seu passivo.

O Clube de Regatas do Flamengo, justiça seja feita, foi o único clube que, apesar de atrasar alguns pagamentos na época em que suas execuções eram gerenciadas pela 19ª Vara do Trabalho, não causou maiores problemas aos seus credores, razão pela qual foi mantido no Ato nº 2.772/03. Nesse caso em particular o Plano Especial de Execuções atingiu plenamente o seu objetivo, comprovando que, para alcançar o seu integral escopo, é fundamental a conscientização dos grandes devedores.

Que as novas regras dos Planos Especiais de Execução, juntamente com a Lei nº 13.155/15, que instituiu o PROFUT – Programa de Modernização da Gestão e de Responsabilidade Fiscal do Futebol Brasileiro, imponham que todos os clubes adotem modelo de gestão mais responsável e profissional, sem o amadorismo que se tornou marca registrada do futebol brasileiro.

  • Conclusões

Que os atos trabalhistas foram excelentes para os clubes de futebol, não há dúvidas, mas complicaram a situação dos credores com valores mais vultosos a receber, mormente com a mudança de regras dos provimentos de 2007 e 2008 do E. TRT da 1ª Região que alteraram a formatação original que tinha como base a Lei nº 6.830/80.

A partir do momento em que as execuções foram concentradas no Juízo Auxiliar de Execuções (CAEP), mero arrecadador, desprovido de poderes executórios, os credores ficaram impossibilitados de recorrer à autoridade competente para promover a execução de eventual saldo devedor. Sua única alternativa foi denunciar os descumprimentos à Presidência do Tribunal e requerer a revogação do plano especial deferido ao clube infrator, o que demandava desgastante litígio, perda de tempo útil e, pior, não restituía os valores sonegados.

A previsão de penalidade pecuniária, na prática, inibiria eventuais descumprimentos.

Os valores pagos mensalmente sempre foram muito abaixo do razoável, o que acarretou sempre o deferimento do prazo no limite máximo de 10 anos, período esse demasiadamente extenso. Nesse particular, palmas para os novos provimentos do TRT da 1ª Região e CGJT que conseguiram finalmente equacionar esse binômio.

Diante de todos os percalços enfrentados pelos credores ao longo dos 15 anos de vigência desse sistema excepcional de execução, seria adequado aperfeiçoar o sistema impondo limite de tempo que cada credor permaneça habilitado no Juízo Auxiliar de Execuções, em respeito à razoável duração do processo, efetividade processual e garantia de recebimento de seus créditos no curso daquele plano.

No mais, foram excelentes os recentes aperfeiçoamentos promovidos pelos Provimentos nº 02/2017 do TRT da 1ª Região, e nº 01/2018, este último da Corregedoria Geral da Justiça do Trabalho (CGJT). Além de reduzir a duração dos planos, possibilitou ao Juízo Centralizador executar os devedores, e impôs obrigação dos clubes ofertarem garantias como condicionante para serem beneficiado pelo sistema excepcional de execução. Sem dúvida alguma terão mais eficácia quando colocados à prova.

Finalmente, com base nas experiências passadas, é imperioso que os Tribunais priorizem a posição de desvantagem dos credores e apliquem de forma rígida as regras atuais dos planos excepcionais de execução, sem conceder benefícios adicionais ou flexibiliza-las, lembrando que o modelo de execução em comento é indiscutivelmente o mais confortável e benéfico para os clubes devedores.

[1] “Art. 28 – O Juiz, a requerimento das partes, poderá, por conveniência da unidade da garantia da execução, ordenar a reunião de processos contra o mesmo devedor.

Parágrafo Único – Na hipótese deste artigo, os processos serão redistribuídos ao Juízo da primeira distribuição.”

[2] “Execução no processo do trabalho – Edição digital — 8. ed.  — São  Paulo, LTr, 2016, pg.47”

[3]  “Competência da Justiça do Trabalho e EC n. 45/04. São Paulo: Atlas, 2006. p. 72.”

[4] “Art. 11 da Lei n. 6.830/80: “A penhora ou arresto de bens obedecerá à seguinte ordem: I – dinheiro; II – título da dívida pública, bem como título de crédito, que tenham cotação em bolsa; III – pedras e metais preciosos; IV – imóveis; V – navios e aeronaves; VI – veículos; VII – móveis ou semoventes; e VIII – direitos e ações. § 1o – Excepcionalmente, a penhora poderá recair sobre estabelecimento comercial, industrial ou agrícola, bem como em plantações ou edifícios em construção. § 2o – A penhora efetuada em dinheiro será conver tida no depósito de que trata o inciso I do art. 9o. § 3o – O Juiz ordenará a remoção do bem penhorado para depósito judicial, particular ou da Fazenda Pública exequente, sempre que esta o requerer, em qualquer fase do processo”

[5] Comentários à CLT, Saraiva, 33º ed.

[6] “Art. 28 – 0 Juiz, a requerimento das partes, poderá, por conveniência da unidade da garantia da execução, ordenar a reunião de processos contra o mesmo devedor.

Parágrafo Único – Na hipótese deste artigo, os processos serão redistribuídos ao Juízo da primeira distribuição.”

[7] A reforma trabalhista e o processo do trabalho: aspectos processuais da Lei n. 13.467/17 — 1. ed. — São Paulo: LTr Editora, 2017, pg 50 – ed. eletrônica;

[8] DINAMARCO, Cândido Rangel. Instituições de direito processual civil., v. I. São Paulo: Malheiros, 2001. p. 108.

[9] In “Fundamentos da Constituição”, Coimbra Editora. Coimbra. 1991, pág. 62.

[10] Súmula nº 259 – TERMO DE CONCILIAÇÃO. AÇÃO RESCISÓRIA – Só por ação rescisória é impugnável o termo de conciliação previsto no parágrafo único do art. 831 da CLT. (Res. 7/1986, DJ 31.10.1986)

[11] Art.502 – Denomina-se coisa julgada material a autoridade que torna imutável e indiscutível a decisão de mérito não mais sujeita a recurso.

[12] Art 5º, XXXVI – a lei não prejudicará o direito adquirido, o ato jurídico perfeito e a coisa julgada;

[13] Art. 831, § único – No caso de conciliação, o termo que for lavrado valerá como decisão irrecorrível, salvo para a Previdência Social quanto às contribuições que lhe forem devidas. (NR) (Redação dada ao parágrafo pela Lei nº 10.035, de 25.10.2000, DOU 26.10.2000);

[14] Art. 2º – Considera-se empregador a empresa, individual ou coletiva, que, assumindo os riscos da atividade econômica, admite, assalaria e dirige a prestação pessoal de serviço.

[15] Art. 22. Ao administrador judicial compete, sob a fiscalização do juiz e do Comitê, além de outros deveres que esta Lei lhe impõe:

I – na recuperação judicial e na falência:

  1. a) enviar correspondência aos credores constantes na relação de que trata o inciso III do caput do art. 51, o inciso III do caput do art. 99 ou o inciso II do caput do art. 105 desta Lei, comunicando a data do pedido de recuperação judicial ou da decretação da falência, a natureza, o valor e a classificação dada ao crédito;
  2. b) fornecer, com presteza, todas as informações pedidas pelos credores interessados;
  3. c) dar extratos dos livros do devedor, que merecerão fé de ofício, a fim de servirem de fundamento nas habilitações e impugnações de créditos;
  4. d) exigir dos credores, do devedor ou seus administradores quaisquer informações;
  5. e) elaborar a relação de credores de que trata o § 2o do art. 7o desta Lei;
  6. f) consolidar o quadro-geral de credores nos termos do art. 18 desta Lei;
  7. g) requerer ao juiz convocação da assembléia-geral de credores nos casos previstos nesta Lei ou quando entender necessária sua ouvida para a tomada de decisões;
  8. h) contratar, mediante autorização judicial, profissionais ou empresas especializadas para, quando necessário, auxiliá-lo no exercício de suas funções;
  9. i) manifestar-se nos casos previstos nesta Lei.

[16] […] II – na recuperação judicial:

  1. a) fiscalizar as atividades do devedor e o cumprimento do plano de recuperação judicial;
  2. b) requerer a falência no caso de descumprimento de obrigação assumida no plano de recuperação;
  3. c) apresentar ao juiz, para juntada aos autos, relatório mensal das atividades do devedor;
  4. d) apresentar o relatório sobre a execução do plano de recuperação, de que trata o inciso III do caput do art. 63 desta Lei;
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